segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

O amor cobre uma multidão de pecados

Reflexões baseadas na leitura do Capítulo 11 do Evangelho Segundo o Espiritismo: Amar o próximo como a si mesmo 

Por estarmos em estado humano, estamos sujeitos às tentações da vida material, portanto, todos nós pecamos. Pecamos em pensamentos, pecamos em sentimentos, pecamos em nossas ações. 

Cometemos em diferentes escalas cada um dos 7 pecados capitais: Gula, Avareza, Luxuria, Ira, Inveja, Preguiça e Orgulho. Mas, não cabe aqui discorrer sobre cada um deles, até porque é tarefa individual identificar quais nos são mais comuns. Porém, é importante falar sobre o que nos incita a praticá-los. 

Nosso espírito ainda em insipiente evolução se deixa envolver pela dualidade, pelo desejo de ter se confrontando com a necessidade de ser, pelos sentimentos antagônicos de simpatia e antipatia, pelo impulso egoísta que macula o altruísmo. 

Essa dualidade nos causa uma dependência emocional, que muitas vezes, nos impede de acessar uma capacidade inerente a todos nós, a empatia. Daí, sem a disposição para conhecer os pontos de vista e sentimentos alheios, nosso julgamento fica frágil, levando-nos a ações reativas, carregadas de certezas rotas, baseadas em desejos que só consideram nossa satisfação. E se atuamos sem ponderar sobre o que é bom para nós e para os outros, há desequilíbrio. Então, tendemos a pecar, mesmo que tenhamos, aparentemente, a melhor das intenções. 

Nossos pecados se revelam, também, nos preconceitos que sentimos e, que na maioria das vezes, não reconhecemos, mas mesmo assim nos orientam a agir em desacordo com a clara instrução de Jesus: “amar ao próximo como a si mesmo”. 

Como disse, escolhi falar sobre pecado, mas também, quero falar sobre o amor, pois somente através do amor seremos capazes de nos purificar.  Jesus nos ensinou que “o amor cobre uma multidão de pecados”, mas de que amor o mestre falava? 

Do amor que une casais, do amor fraterno, do amor parental, do amor filial? Acredito que a todos, e ao mesmo tempo, a nenhum, pois a forma como vivemos o amor é que determina sua qualidade, sua pureza. 

Amor verdadeiro inspira confiança, não fé cega. 
Amor verdadeiro é desprovido do desejo de ter. 
Amor verdadeiro é libertador, jamais subjuga. 

No Evangelho segundo o Espiritismo, no capitulo 11, em Instruções dos Espíritos nos é ensinado: "O amor é de essência divina. Desde o mais elevado até o mais humilde, todos vós possuís, no fundo do coração, a centelha desse fogo sagrado... Não acrediteis na esterilidade e no endurecimento do coração humano, que cederá, mesmo de malgrado, ao verdadeiro amor. Este é um imã a que ele não poderá resistir, e o seu contato vivifica e fecunda os germes dessa virtude, que estão latentes em vossos corações. A Terra, morada de exílio e de provas, será então purificada por esse fogo sagrado, e nela se praticarão a caridade, a humildade, a paciência, a abnegação, a resignação, o sacrifício, todas essas virtudes filhas do amor". 
  
Mas, então, se somos feitos de virtudes, porque nos deixamos levar por sentimentos nada nobres como raiva, intolerância, medos? Porque temos dificuldade em controlar nossos atos motivados por esses sentimentos? 

Intuo que é exatamente essa dificuldade em reconhecer essa centelha de fogo sagrado que nos leva constantemente a recair no erro e pecar. Mas, o que é preciso fazer para nos permitimos vivenciar esse amor? 

Creio, que o primeiro e importante passo é a auto-aceitação, o reconhecimento das virtudes, sem ostentá-las e das sombras, sem rechaça-las. E para tal, nunca podemos esquecer que estamos numa longa jornada desenvolvimento e que a cada passo, a cada estação experimentamos diferentes estágios evolutivos e a percepção dessa chama amorosa dependerá de quanto nos esforçaremos nesse longo caminhar. 

Ainda no capítulo 11, o Espírito Lázaro diz que "O amor resume toda a doutrina de Jesus, porque é o sentimento por excelência, e os sentimentos são os instintos elevados à altura do progresso realizado. No seu ponto de partida, o homem só tem instintos; mais avançado e corrompido, só tem sensações; mais instruído e purificado, tem sentimentos; e o amor é o requinte do sentimento. Não o amor no sentido vulgar do termo, mas esse sol interior, que reúne e condensa em seu foco ardente todas as aspirações e todas as revelações sobre-humanas. A lei do amor substitui a personalidade pela fusão dos seres e extingue as misérias sociais". 
Disse que o homem, no seu início, tem apenas instintos. Aquele, pois, em que os instintos dominam, está mais próximo do ponto de partida que do alvo. Para avançar em direção ao alvo, é necessário vencer os instintos a favor dos sentimentos, ou seja, aperfeiçoar a estes, sufocando os germes latentes da matéria. Os instintos são a germinação e os embriões dos sentimentos. Os seres menos adiantados são os que, libertando-se lentamente de sua crisálida, permanecem subjugados pelos instintos". 

Então, em nossa jornada terrena muitas vezes confundimos amor com desejo, com posse, com paixão. E levados pelo instinto, pecamos, levados pelas sensações, pecamos. O amor como sentimento por excelência, conforme nos diz Lázaro, não está sujeito a esse vendaval de emoções que nos desequilibra, nos faz egoícos, nos faz pecadores. O amor genuíno nos dá força para pavimentar nossa estrada de desenvolvimento e convidar nossos irmãos a seguir amorosamente o estirão da vida. 

Lázaro ainda nos fala: "O Espírito deve ser cultivado como um campo. Toda a riqueza futura depende do trabalho atual. Então, que possamos cultivar bons sentimentos e encontrar em nossos imos essa flor de eterna beleza e cobrir com suas pétalas a multidão de pecados que cometemos em nossas sucessivas encarnações". 

E que possamos, também, nos perdoar e perdoar a todos aqueles por quem sentimos mágoas e assim remover as máculas de nossos corações. 

Eu acredito no interesse e na capacidade humana de fazer o bem. 

Eu acredito na capacidade humana de amar. De pura e verdadeiramente, amar! 

Gostaria de finalizar com um texto que para mim faz muito sentido e é aplicável ao amor, seja ele Ágape ou Éros. 

Amar é dedicação e entrega. 
Amar é um verbo e o fruto dessa ação é o amor. 
O amor é um exercício de jardinagem. 
Arranque o que faz mal, prepare o terreno, semeie, seja paciente, regue e cuide. 
Esteja preparado porque haverá pragas, secas ou excessos de chuvas, mas nem por isso abandone o seu jardim. 
Ame, ou seja, aceite, valorize, respeite, dê afeto, ternura, admire e compreenda. Simplesmente: Ame!!! 

A inteligência sem amor nos faz perversos. 
A justiça sem amor nos faz implacáveis 
A diplomacia sem amor nos faz hipócritas
O êxito sem amor nos faz arrogantes
A riqueza sem amor nos faz avarentos
A docilidade sem amor nos faz servis
A pobreza sem amor nos faz orgulhosos
A beleza sem amor nos faz ridículos
A autoridade sem amor nos faz tiranos
O trabalho sem amor nos faz escravos
A simplicidade sem amor nos deprecia 
A lei sem amor nos escraviza 
A vida sem AMOR... não faz sentido.


Imagem: Daniel B. Holeman

quinta-feira, 15 de novembro de 2012

O que é doação?

Reflexões baseadas na leitura do Capítulo 13 do Evangelho Segundo o Espiritismo: Que sua mão esquerda não saiba o que faz a direita 

Há alguns dias abri o guarda-roupa e separei roupas e sapatos para doação. O critério adotado foi o seguinte: se não usei a peça nos últimos três meses é porque não preciso dela. Enchi duas sacolas e coloquei no carro para entregar a alguns desabrigados que fizeram dos baixos de um viaduto sua casa.

Senti-me bem pela boa ação e segui pelos dias, cuidando dos meus afazeres. Naquela semana, quando fui realizar o Evangelho no Lar, abri o livro ao acaso como habitualmente faço e eis que meus olhos pousaram sobre a parábola “O Óbolo da Viúva”, que diz:
Jesus sentou-se em frente ao gazofilácio para observar de que modo o povo colocava ali seu dinheiro. Depois de algum tempo, percebeu que as pessoas ricas depositavam grandes quantidades. Veio então uma pobre viúva que depositou apenas duas pequenas moedas. Vendo isso, Jesus chamou Seus discípulos e lhes disse: Em verdade Eu digo a vocês que esta pobre viúva deu mais do que todos aqueles que antes depositaram suas dádivas no gazofilácio. Enquanto todos os outros deram do que sobrava de sua abundância, a viúva deu o que lhe fazia falta, deu mesmo tudo o que tinha para seu sustento.

Após a leitura, lembrei-me imediatamente dos sem teto a quem doei aquilo que já mais me servia. Desde então, esse tema tem estado frequentemente em minhas reflexões.
Será que eu doaria algo que ainda me serviria? Será que conseguiria abrir mão de algo que ainda poderia me ser útil se algum irmão necessitasse mais do que eu? Qual seria o limite entre a doação verdadeiramente desprendida e o livrar-me do que não mais me serve ou do que me sobra?

E como a vida nos presenteia constantemente com oportunidades de reflexão e desenvolvimento, basta para isso estar atento, o tema passou a figurar nos meus dias, às vezes sutilmente, às vezes veementemente.

Há uma semana, durante uma reunião de trabalho, um querido amigo, Sergio Resende comentou sobre um livro chamado Confiança, Doação, Gratidão, de Lex Bos, e de seu comentário ecoou em meu coração a seguinte reflexão: A questão não é dar e receber, dar para receber não é doação. A questão é fazer fluir.

Então, além de refletir sobre o que seria a verdadeira doação, sobre a capacidade de doar até mesmo o que ainda me é caro e necessário, passei a pensar no que seria o real significado da doação, em como atuar no mundo contribuindo para esse fluir que poderá permitir que as necessidades de todos sejam atendidas.

E essa é outra pergunta que tem me perseguido: Do que realmente necessito? E falo das necessidades materiais, afinal tenho que zelar pela manutenção do que é em mim matéria, visto que ainda estou encarnada, mas também das necessidades anímicas e espirituais. Saber exatamente do que careço exige exercício continuo e desapego. Não é fácil, mas fundamental para a evolução. Se não me debruço sobre mim para obter esse entendimento, corro o risco de viver na superfície, de não perceber o que é de fato importante para mim e me perder em devaneios egoicos, em desejos fúteis que, se atendidos, me darão um prazer momentâneo, mas não curarão as feridas da alma que tento negar não reconhecendo as verdadeiras necessidades. E se estou sempre tentando cobrir meus “buracos” como hei de perceber o que o outro realmente precisa?

Buscando inspiração para jogar luz a essas indagações, busco o Evangelho e sigo a leitura desse capitulo.
Muita gente lamenta não poder fazer todo o bem que desejaria, por falta de recursos, e se querem a fortuna, dizem, é para bem aplicá-la. A intenção é louvável, sem dúvida, e pode ser muito sincera de parte de alguns; mas o seria de parte de todos, assim completamente desinteressados? Não haverá os que, inteiramente empenhados em beneficiar os outros, se sentirão bem de começar por si mesmos, concedendo-se mais algumas satisfações, um pouco mais do supérfluo que ora não têm, para dar aos pobres apenas, o resto? Este pensamento oculto, talvez dissimulado, mas que encontrariam no fundo do coração, se o sondassem, anula o mérito da intenção, pois a verdadeira caridade faz antes pensar nos outros que em si mesmo.
Aqueles cuja intenção é desprovida de qualquer interesse pessoal, deve consolar-se de sua impotência para fazer o bem que desejariam, lembrando que o óbolo do pobre, que o tira da sua própria privação, pesa mais na balança de Deus que o ouro do rico, que dá sem privar-se de nada. Seria grande a satisfação, sem dúvida, de poder socorrer largamente a indigência; mas, se isso é impossível, é necessário submeter-se a fazer o que se pode. Aliás, não é somente com o ouro que se podem enxugar as lágrimas, e não devemos ficar inativos por não o possuirmos. Aquele que deseja sinceramente tornar-se útil para os seus irmãos, encontra mil ocasiões de fazê-lo. Que as procure e as encontrará. Se não for de uma maneira, será de outra, pois não há uma só pessoa, no livre gozo de suas faculdades, que não possa prestar algum serviço, dar uma consolação, amenizar um sofrimento físico ou moral, tomar uma providência útil. Na falta de dinheiro, não dispõe cada qual do seu esforço, do seu tempo, do seu repouso, para oferecer um pouco aos outros? Isso também é a esmola do pobre, o óbolo da viúva.

Então, após ler e reler, fico em meu intimo com as perguntas que compartilho agora:

O que tenho para doar?
O que posso doar?
Quais serão as minhas duas moedas?
O que tenho recebido como doação?
Seria eu verdadeiramente grata a tudo o que a vida me dá?

E a pergunta que pulsa, lateja é:
O que é doação? O que e quando dou sem nenhum interesse em retribuição?

Encontrar essas respostas é fundamental, pois é urgente compreender que:

A expectativa de ter anula o ato da entrega
A expectativa de ter tira a beleza da ação
A expectativa de ter me afasta do outro
A expectativa de ter me afasta de mim
A expectativa de ter me afasta do divino
É preciso confiar em nossa imensa capacidade de dar
E, também, confiar que no tempo certo o que há de vir, virá.
Só assim poderemos desenvolver a verdadeira gratidão
A gratidão por ter aprendido o significado da genuína partilha.
Esse sentimento que envolve a alma e enobrece o espírito.



segunda-feira, 20 de agosto de 2012

Vícios e Virtudes

Reflexões baseadas na leitura do Capítulos 13 (Que a mão esquerda não saiba o que faz a direita) e 17 (Sede perfeitos) do Evangelho Segundo o Espiritismo 


Em nosso estado humano nos deparamos amiúde com situações que pedem a prática de nossas virtudes. Momentos em que aquilo que é de mais puro e autentico em nós pode ser colocado a serviço do outro. 

Sobre essa qualidades, o evangelho traz no capítulo 17: A virtude, no seu grau mais elevado, abrange o conjunto de todas as qualidades essenciais que constituem o homem de bem. Ser bom, caridoso, trabalhador, sóbrio, modesto, são as qualidades do homem virtuoso. Infelizmente, são quase sempre acompanhadas de pequenas falhas morais, que as deslustram e enfraquecem. Aquele que faz alarde de sua virtude não é virtuoso, pois lhe falta a principal qualidade: a modéstia, e sobra-lhe o vício mais oposto: o orgulho. 

No capitulo 13, a mensagem de Jesus nos diz: Guardai-vos, não façais as vossas boas obras diante dos homens, com o fim de serdes vistos por eles; de outra sorte não tereis a recompensa da mão de vosso Pai, que está nos Céus. Quando, pois, dás a esmola, não faças tocar a trombeta diante de ti, como praticam os hipócritas nas sinagogas e nas ruas, para serem honrados dos homens; em verdade vos digo que eles já receberam a sua recompensa. Mas quando dás a esmola, não saiba a tua esquerda o que faz a tua direita; para que a tua esmola fique escondida, e teu Pai, que vê o que fazes em segredo, te pagará... “Os que fazem o bem com ostentação já receberam a sua recompensa”. Com efeito, aquele que busca a sua glorificação na Terra, pelo bem que faz, já se pagou a si mesmo. Deus não lhe deve nada; só lhe resta a receber a punição do seu orgulho. 

Os dicionários traduzem orgulho como elevado conceito que alguém faz de si próprio.“ E partindo dessa afirmação quero perguntar: quem de nós nunca fez um bem esperando reconhecimento? Quem de nós empreendeu grande esforço em prol do próximo e no seu intimo aguardou um olhar, uma palavra de agradecimento? Quem de nós já não fez uma boa ação e mesmo tendo a genuína intenção de contribuir, não relatou o ocorrido aos familiares e amigos com uma intenção, mesmo que não percebida, de ser visto como bom samaritano, como alguém de bom coração? Quem de nós já não agiu a favor do outro desejando ter suas qualidades enaltecidas? 

A existência humana é permeada pela dualidade, somos compostos de luz e sombra, de bem e mal. Para regular a convivência nos pautamos no certo e errado, definições que muitas vezes esquecem a avaliação do que é bom e o discernimento do que o contexto e momento pedem. E se ficarmos reféns de ideias preconcebidas sobre nos mesmos e direcionar nossas ações para confirmar o que acreditamos, corremos o enorme risco de servir apenas ao ego. De fazer pelo outro com a expectativa de alimentar a nós mesmos. 

O Evangelho nos traz o seguinte: O homem possuído pelo sentimento de caridade e de amor ao próximo faz o bem pelo bem, sem esperar recompensa, paga o mal com o bem, toma a defesa do fraco contra o forte e sacrifica sempre o seu interesse à justiça. Encontra sua satisfação nos benefícios que distribui, nos serviços que presta, nas venturas que promove, nas lágrimas que faz secar, nas consolações que leva aos aflitos. Seu primeiro impulso é o de pensar nos outros, antes que em si mesmo, de tratar dos interesses dos outros, antes que dos seus. O egoísta, ao contrário, calcula os proveitos e as perdas de cada ação generosa. 

Mas, como ter clareza sobre o que nos motiva a agir? Como podemos aferir o grau de genuinidade no interesse no próximo? Reflito sobre o assunto e mais perguntas se apresentam: O que cega meus olhos? Seria a vaidade incontida? Seriam os infundados medos? Seriam as virtudes enaltecidas? Ou apenas a venda tecida em cisma e orgulho? 

E de pergunta em pergunta a única resposta que me parece razoável é a que traz o autoconhecimento como caminho. Sinto que a única forma de ter atenção genuína no outro passa por um profundo e corajoso olhar sobre si. É preciso reconhecer as virtudes, não para enaltece-las, subir num pedestal. É preciso ter essa consciência para que saibamos quais recursos dispomos para servir, para potencializá-los a favor do bem comum e confiar que o reconhecimento chegará naturalmente. 

Mas, é necessário, também, a bravura para reconhecer o que é sombra, o que nos anula a virtude. E esse olhar deve ser amoroso. Percebo que aceitar o que nos deforma só deve ocorrer se a intenção for de melhora e não de submissão traduzida na frase tão comum: eu sou assim. 

Sinto que é preciso um exercício continuo para reconhecer o “sou assim” e buscar a transformação do que não nos eleva. Olhar para dentro e assim acolher o que segue fora. 

Há alguns dias escrevi uma poesia inspirada nessa reflexão: 

A sombra faz parte de nós
Assim como a luz que a pode acolher
Para o acolhimento é preciso decisão e coragem
Aceitar os espelhos que a vida apresenta
Que nos mostra o que em nós é disforme
E que se negarmos se faz ainda mais forte 
A figura horrenda, monstruosa e triste 
A que desejamos matar, impedir que nos vença
É na verdade fração de algo muito maior
E só nos sombreia se não a aceitarmos inteira
Difícil e extensa tarefa que exige bravura
Uma força que existe no fundo da alma
Que só é descoberta ao nos despirmos do orgulho
E abertamente olharmos para a vida
Na genuína busca do que em nos é essência
Aceitando o feio que reside em nós
Para florescer a beleza que carece cuidados
Sem esquecer, por nem mesmo um segundo
Que não estamos sozinhos nessa grande jornada
E que o que parece verdugo pode ser redenção
Aquela réstia de luz que ilumina o escuro
Nos ajuda a enxergar o que estava embaçado
Para com nova visão compreender o que somos
E reverentes e agradecidos até pelas dores
Seguirmos em frente atentos ao mundo
E não somente ao próprio umbigo 

Eu ainda não consigo. Mas, estou atenta e não desisto. 

Gostaria de encerrar com uma fábula que pode nos ensinar um pouco sobre como transformar um defeito em virtude. E em como a generosidade de uma alma sábia pode fazer florescer beleza no árido. 

Uma velha senhora chinesa possuía dois grandes vasos, cada um suspenso na extremidade de uma vara que ela carregava nas costas.
Um dos vasos era rachado e o outro era perfeito. Este último estava sempre cheio de água ao fim da longa caminhada do rio até casa, enquanto o rachado chegava meio vazio.
Durante muito tempo a coisa foi andando assim, com a senhora chegando a casa somente com um vaso e meio de água.
Naturalmente o vaso perfeito era muito orgulhoso do próprio resultado e o pobre vaso rachado tinha vergonha do seu defeito, de conseguir fazer só a metade daquilo que deveria fazer.
Depois de dois anos, refletindo sobre a própria amarga derrota de ser 'rachado', o vaso falou com a senhora durante o caminho:
'Tenho vergonha de mim mesmo, porque esta rachadura que eu tenho faz-me perder metade da água durante o caminho até a sua casa...' 
A velhinha sorriu:
-Reparaste que lindas flores há somente do teu lado do caminho? Eu sempre soube do teu defeito e portanto plantei sementes de flores na beira da estrada do teu lado. E todos os dias, enquanto a gente voltava, tu as regavas. Durante dois anos pude recolher aquelas belíssimas flores para enfeitar a mesa. Se tu não fosses como és, eu não teria tido aquelas maravilhas na minha casa. 
Cada um de nós tem o seu próprio defeito. Mas é o defeito que cada um de nós tem, que faz com que nossa convivência seja interessante e gratificante. 
É preciso aceitar cada um pelo que é... 
E descobrir o que há de bom nele. 

Que, então, possamos descobrir o que há de bom em nós e colocar a serviço do mundo. O maior reconhecimento virá da satisfação que revestirá o coração de alegria.



segunda-feira, 30 de julho de 2012

O Granar do Trigo

Reflexões baseadas na leitura do Capítulo 27 do Evangelho Segundo o Espiritismo: Pedi e obtereis 

"Um dia, um velho fazendeiro veio a Deus e disse-lhe: 

- Olha, você pode ter criado o mundo, mas preciso lhe dizer uma coisa. 
Você não é fazendeiro. Não sabe nem o bê-a-bá da agricultura. 
Você tem muito o que aprender. 

Ao que Deus respondeu: 
- O que você sugere? 
- Dê-me um ano e permita que as coisas sejam de acordo com a minha vontade. E veja o que acontecerá: não haverá mais pobreza! 

Deus concordou e um ano foi dado ao fazendeiro. Naturalmente, ele pedia e pensava somente no melhor. 
Nada de trovões, de ventos fortes, nenhum perigo para a safra. 
Tudo confortável, aconchegante. 
O fazendeiro estava muito feliz. 
O trigo crescia tanto! 
Quando queria sol, havia sol. 
Quando queria chuva, havia chuva, o tanto que quisesse. 
Nesse ano, tudo estava certo. 
Matematicamente preciso. 
O trigo estava crescendo muito. 

O fazendeiro procurava Deus e dizia: 
- Olhe! Desta vez a safra será tão grande que, por 10 anos, mesmo que as pessoas não trabalhem, haverá comida suficiente! 

Mas quando fizeram a colheita, não havia grãos. O fazendeiro ficou surpreso e perguntou a Deus: 
- o que aconteceu! O que saiu errado? 

E Deus respondeu-lhe: 

- Por não existir desafio, conflito, fricção, já que você evitou tudo de ruim, o trigo permaneceu impotente. 

Uma pequena fricção é uma necessidade. As tempestades, os trovões e os raios são necessários. 

Eles agitam a alma dentro do trigo". 

Guardada a poesia contida nessa parábola, podemos inferir que a conversa do fazendeiro com Deus trata-se de uma oração. É comum ao enfrentarmos dificuldades recorrer às orações, às preces. 

Segundo o Evangelho Segundo o Espiritismo, as condições da prece foram claramente definidas por Jesus. Quando orardes, diz ele, não vos coloqueis em evidência, mas orai em secreto. Não fingi orar demasiado, porque não será pelas muitas palavras que serão atendidos, mas pela sinceridade delas. Antes de orar, se tiverdes qualquer coisa contra alguém, perdoai-a, porque a prece não poderia ser agradável a Deus, se não partisse de um coração purificado de todo sentimento contrário à caridade. 

Mas, o que é preciso fazer para purificar o coração antes de se por em oração? Quantas mágoas, medos e inseguranças nos dominam e nos afastam de nossa essência? Quantas crenças a cerca de nós mesmos, conscientes ou não, criam barreiras para que possamos nos abrir verdadeiramente em nossas orações. 

Recentemente, falei aqui sobre o perdão e a importância do autoperdão. E mais uma vez esse tema pede passagem. Pois, como haverei de me conectar, de coração puro, com o plano espiritual de luz se não for capaz de buscar a compreensão e o perdão para meus próprios erros e, também, para as faltas alheias? 

E não falo de carregar culpas, pois isso não nos leva a nada, senão dor e incompreensão. Falo, sim, da disposição de trilhar o caminho para a verdadeira reforma intima, que é feito de reconhecimento, auto-aceitação e vontade genuína de mudança. 

É preciso reconhecer a luz e a sombra que habitam nosso coração e a partir disso acolher cada partícula que compõe nossa essência. 

Muitos de nós passamos a vida a justificar nossos infortúnios olhando apenas para fora, buscando nas circunstancias e em outras pessoas as culpas pelas mazelas que porventura estejamos vivendo. 

E rezamos, pedimos a Deus, direta ou indiretamente, que o mal seja de nós afastado, mas pouco ou nada fazemos. Ficamos passivos, aguardando a providência divina para que nossos problemas se resolvam. Há, ainda, outro fator: a teimosia que nos deixa obcecados por atingir determinadas metas e não nos atentamos para as formas e métodos adotados, pouco observamos que mudanças de atitudes são necessárias. E se nossos clamores não forem atendidos, nos sentimos injustiçados, não cuidados. 

A vida nós dá o que precisamos, e não, necessariamente, o que queremos. Pois, o que queremos é, muitas vezes, fruto da vaidade, das paixões que nosso corpo mental inferior abriga. Nosso ego nos prega peças, nos faz crer que caprichos são necessidades. 

Para que nossas preces sejam atendidas, é preciso acessar nosso Eu Espiritual, ter compreensão de suas reais necessidades, aquelas que quando atendidas nos encaminha para a evolução. E para isso é preciso disciplina e desapego. Disciplina, pois o caminho é longo e cheio de curvas e distrações. Desapego, pois é importante reconhecer que nada a nós pertence, salvo o nosso livre-arbítrio. 

Para mim, quando Jesus diz: Não fingi orar demasiado, porque não será pelas muitas palavras que serão atendidos, mas pela sinceridade delas, entendo que essa sinceridade só é possível se tivermos naquele momento da prece esse contato com que há de mais profundo em nossas almas. Se tivermos a compreensão, mesmo que breve, de quem somos. 

Por isso, acredito que o decidido esforço para o autoconhecimento é o caminho para essa conexão verdadeira com o plano espiritual de luz. 

Penso que, se nos colocamos em prece e rogamos alguma graça, devemos ter consciência de que seremos atendidos somente se o pedido for verdadeiramente dirigido à nossa evolução. E, também, não devemos esquecer que nosso pensamento tem um poder inestimável e a vibração do que vai em nossa mente tem papel importante no alcance do que desejamos. 

Se vibrarmos em mágoa, incompreensão e dor, provavelmente, atrairemos energias negativas e sugadoras, porém se nossa vibração se basear em amor e compaixão abriremos os caminhos para a realização. 

E para encerrar, gostaria de lembrar que nossas preces não devem apresentar apenas rogativas, é preciso agradecer à dádiva da vida e todos os dias valorizar essa experiência inestimável que é estar encarnado nesse planeta, que mesmo sendo ainda considerado como um lugar de provas e expiações é rico, belo, diverso e profícuo em oportunidades e bênçãos. 

Que possamos todos ser gratos e bem aproveitar essa oportunidade evolutiva que nos foi concedida. 

Que possamos ser pacientes e tenazes para que alcancemos as graças pedidas em nossas orações. 

Que possamos fazer a nossa parte e granar nosso trigo. 



sexta-feira, 18 de maio de 2012

O poder do perdão


Reflexões baseadas na leitura do Capítulo 10 – Bem-aventurados os misericordiosos 



Há na prática do perdão, e na prática do bem, em geral, além de um efeito moral, um efeito também material. A morte, como se sabe, não nos livra dos nossos inimigos. Os Espíritos vingativos perseguem sempre com o seu ódio, além da sepultura, aqueles que ainda são objeto do seu rancor. Daí ser falso, quando aplicado ao homem, o provérbio: “Morto o cão, acaba a raiva”. O Espírito mau espera que aquele a quem queira mal esteja encerrado em seu corpo, e assim menos livre, para mais facilmente o atormentar, atingindo-o nos seus interesses ou nas suas mais caras afeições. É necessário ver nesse fato a causa da maioria dos casos de obsessão, sobretudo daqueles que apresentam certa gravidade, como a subjugação e a possessão. O obsedado e o possesso são, pois, quase sempre, vítimas de uma vingança anterior, a que provavelmente deram motivo por sua conduta. Deus permite a situação atual, para os punir do mal que fizeram, ou, se não o fizeram, por haverem faltado com a indulgência e a caridade, deixando de perdoar. Importa, pois, com vistas à tranquilidade futura, reparar o mais cedo possível os males que se tenham praticado em relação ao próximo, e perdoar aos inimigos, para assim se extinguirem, antes da morte, todos os motivos de desavença, toda causa profunda de animosidade posterior. Dessa maneira se pode fazer, de um inimigo encarnado neste mundo, um amigo no outro, ou pelo menos ficar com a boa causa, e Deus não deixa ao sabor da vingança aquele que soube perdoar. Quando Jesus recomenda que nos reconciliemos o mais cedo possível com o nosso adversário, não quer apenas evitar as discórdias na vida presente, mas também evitar que elas se perpetuem nas existências futuras. Não sairás de lá, disse ele, enquanto não pagares o último ceitil, ou seja, até que a justiça divina não esteja completamente satisfeita. 

Minhas reflexões

O que significa o verdadeiro perdão? O que aquele que perdoa necessita fazer para que o perdão seja genuíno? Como ter clareza de que o perdão é verdadeiro e não apenas um “dourar a pílula”? 

E essas perguntas me levaram a outra inquietação: E o autoperdão, quando e como ele acontece? 

É comum quando agimos de maneira a causar desconforto, incomodo e dores a outros o ato de pedir desculpas. Mas, o que pode significar esse ato? 

Analisando friamente a palavra Desculpa temos o prefixo DES que denota exclusão seguido da palavra CULPA. Então, é possível dizer que desculpar significa excluir a culpa de alguém, ou seja, quando peço desculpas é como se estivesse, sem perceber, pedindo ao outro que retire de mim algo que deve ser retirado com esforço e consciência por mim mesmo. 

Porém quando digo genuinamente, SINTO MUITO, revelo que percebo o mal causado, qualquer que seja sua dimensão, e compreendo a dor, que mesmo involuntariamente causei, gerando possibilidade para o nascimento do verdadeiro PERDÃO. 

Sinto que o PERDÃO não se configura numa palavra e sim num ato de amor e bondade que deve ser realizado com o coração livre de ressentimentos 

Há uma frase atribuída a William Shakespeare que diz: "Guardar ressentimentos é como tomar veneno e esperar que a outra pessoa morra" 

E quando guardamos ressentimentos contra nós mesmos? Que veneno é esse que ingerimos a conta-gotas quando nos sentimos culpados e não aprofundamos em nossa alma para compreender as razões dessa magoa? 

Estudamos, na apometria, a auto-obsessão, situações em que nós mesmos nos obsediamos seja com pensamentos obsessivos dessa encarnação ou de outras. Percebo que a culpa e a ausência de perdão são alguns dos grandes vilões que nos conduzem às dores e tristezas que podemos viver. Nós muitas vezes somos os agentes causadores de nossas dores e das alheias também. 

E se de encarnação em encarnação acumularmos culpas e mágoas, como cuidaremos do nosso efetivo desenvolvimento espiritual? 

Realmente, não tenho respostas para essas perguntas ou talvez tenha muitas respostas que ainda não foram acolhidas em minha alma, mas posso afirmar que se não fizermos uma pesquisa interna – que pode se configurar num árduo trabalho – teremos pouco êxito no exercício do perdão e do autoperdão. 

Para finalizar gostaria de trazer uma definição de perdão que a mim faz bastante sentido. O perdão é um processo mental ou espiritual de cessar o sentimento de ressentimento contra outra pessoa ou contra si mesmo, decorrente de uma ofensa percebida, diferenças, erros ou fracassos, ou cessar a exigência de castigo ou restituição. 

Deve ser concedido sem qualquer expectativa de compensação, e pode ocorrer sem que o perdoado tome conhecimento (por exemplo, uma pessoa pode perdoar outra pessoa já desencarnada ou que não se vê há muito tempo). 

O perdão é o esquecimento completo e absoluto das ofensas, vem do coração, é sincero, generoso e não fere o amor próprio do ofensor. Não impõe condições humilhantes tampouco é motivado por orgulho ou ostentação. O verdadeiro perdão se revela nas palavras, mas é reconhecido pelos atos. 

Então, sinto que é importante tomarmos contato com nossas magoas e culpas e com a amorosidade que o mestre Jesus nos ensinou reconsiderar nossos julgamentos a cerca de todos os que nos cercam, buscando a compreensão dos motivos que os levam a agir da forma que agem e assim verdadeiramente perdoar. 

E o exercício que pode ser bastante difícil, mas fortemente necessário, é o de corajosamente PERDOAR-SE. Sinceramente, não vejo possibilidade de perdoar o outro se eu não for capaz do autoperdão. 



sexta-feira, 13 de abril de 2012

Amar ao próximo

Reflexões baseadas na leitura do Capítulo 11 do Evangelho Segundo o Espiritismo: Amar o próximo como a si mesmo 


Amarás ao teu próximo como a ti mesmo, essas foram as palavras de Jesus quando inquirido pelos Fariseus sobre qual seria o maior mandamento da lei. 

Mas, qual o significado desse amor sobre o qual Jesus falava? 

Ao longo dos tempos a palavra amor foi sendo banalizada. O amor sobre o qual Jesus falava não refere-se apenas ao sentimento que une os casais, aquele dedicado pelos pais a seus filhos e dos filhos aos pais. O amor cristão é aquele que nos permite olhar com compaixão para todos aqueles que cruzam nosso caminho. É aquele que nos conecta com genuíno interesse a quem quer que seja. 

Amor é mais que sentimento, amor é renovação, amor é compaixão, amor é desapego. 

Mas, como seria possível amar verdadeiramente se somos seres imperfeitos em busca de desenvolvimento? 

Se devemos ter compaixão pelo outro, penso que é preciso começar a fazer o exercício de autoreconhecimento. Sim, autoreconhecimento! É preciso ter a coragem de reconhecer e jogar luz àquelas características que tentamos ocultar, às nossas não virtudes, às nossas sombras. 

Se Jesus disse amais uns aos outros como a ti mesmo, em suas palavras está implícito que só é possível amar se houver amor próprio. 

Como haveremos de amar se não houver esforço para conhecer profundamente a alma que habita nosso corpo? Como poderemos dedicar nosso amor a outro sem que antes tenhamos compreensão de nós mesmos? Como poderei atender as necessidades de outro se tenho pouca clareza sobre as minhas próprias? 

Acredito que para amar o próximo é preciso saber quem somos e isso só é possível com o esforço e decisão. É preciso olhar mais para dentro do que para fora, é preciso reconhecer as próprias mazelas e fortalecer as virtudes. É preciso não apontar os erros e descaminhos dos outros, é preciso respeitar as escolhas e estar perto, disponível para acolher se necessário for. 

Porém, muitas vezes, nos deixamos levar pelas circunstancias da vida e nos afastamos do que é, de fato, essencial e não percebemos a beleza e a força amorosa que reside em nós mesmos e ficamos esperando que o mundo atenda nossas necessidades. E sem perceber cegamos, emudecemos e ensurdecemos para os chamamentos de nossa alma. 

E se não notamos ou não damos atenção ao clamor de nossas almas, como haveremos de se dedicar ao outro com verdadeiro amor? 

A nós foi dada a dádiva da vida, essa experiência que nos permite desenvolvimento, que nos permite errar e aprender com os erros e por incontáveis vezes podemos voltar para realizar o que não demos conta de fazer. 

E encarnação após encarnação nos é dada a oportunidade de vivenciar o amor, mas muitas vezes confundimos esse sentimento com sensações. Confundimos amor com paixão, desejo, interesse, simpatia... 

Ainda vivemos muito conectados com a vivência terrena do amor e por isso confundimos esse nobre sentimento. 

Acredito que para amarmos verdadeiramente precisamos compreender que ainda somos suscetíveis aos sentimentos carregados de polaridade como atração e repulsa, simpatia e antipatia. 

Sinto que é preciso acolher essas emoções que muitas vezes nos fazem reféns de nós mesmos. Ao compreender que é humano senti-las, podemos aceitá-las como parte de nós, mas não mais nos deixar conduzir por elas. 

No capítulo 5 do Evangelho segundo o Espiritismo, Bem aventurados os aflitos, há uma passagem que diz: Libertar-se do homem velho significa deixar para traz o orgulho, a vaidade, os vícios e os maus procedimentos que ao longo de muitas existências vamos praticando. Quando nos libertarmos dessa maneira de agir, nascerá o homem novo, cheio de virtudes e pronto para praticar os ensinamentos de Cristo. 

Se cá estamos, é sinal de que ainda há muito a aprender, muito esforço a empreender e sinto que para a maioria de nós, algumas lições ainda são incompreensíveis, e por isso não se transformam em aprendizados que poderão ser levados adiante. 

Talvez, o que possamos fazer é estar mais atentos ao que está a nossa volta, não colocando nossos problemas e inquietações acima de tudo. Sinto que é preciso exercitar o olhar amoroso ao outro, tentando compreender as razões de seu comportamento, mesmo que seja algo que a princípio nos pareça aviltante ou contra nós. O amor nasce na tolerância, na empatia, na aceitação. 

Certa vez, recebi um texto que fala de uma maneira muito interessante sobre o amor. É mais ou menos assim: 

"Amar é uma decisão, não um sentimento. 
Amar é dedicação e entrega. 
Amar é um verbo e o fruto dessa ação é o amor. 
O amor é um exercício de jardinagem: arranque o que faz mal, prepare o terreno, semeie, seja paciente, regue e cuide. 
Esteja preparado porque haverá pragas, secas ou excessos de chuvas, mas nem por isso abandone o seu jardim. 
Amar exige aceitação, valorização, respeito, afeto, ternura, admiração e compreensão. 
Isso é tudo, então, ame! 

Para finalizar, gostaria de citar um ser humano que é exemplo de dedicação amorosa aos outros, Madre Teresa de Calcutá. Ela costumava repetir: “Não usemos bombas nem armas para conquistar o mundo. Usemos o amor e a compaixão. A paz começa com um sorriso.” 

Que possamos seguir o conselho dessa sabia senhora que nos deixou há quase 15 anos, mas que certamente está amorosamente zelando por nós. 

sábado, 10 de março de 2012

Quantos mundos?


Do ensinamento dado pelos Espíritos, resulta que os diversos mundos possuem condições muito diferentes uns dos outros, quanto ao grau de adiantamento ou de inferioridade dos seus habitantes. Dentre eles, há os que são ainda inferiores à Terra, física e moralmente. Outros estão no mesmo grau, e outros lhe são mais ou menos superiores, em todos os sentidos. Nos mundos inferiores a existência é toda material, as paixões reinam soberanas, a vida moral quase não existe. À medida que esta se desenvolve, a influência da matéria diminui, de maneira que, nos mundos mais avançados, a vida é por assim dizer toda espiritual.

Nos mundos intermediários, o bem e o mal se misturam, e um predomina sobre o outro, segundo o grau de adiantamento em que se encontrarem. Embora não possamos fazer uma classificação absoluta dos diversos mundos, podemos, pelo menos, considerando o seu estado e o seu destino, com base nos seus aspectos mais destacados, dividi-los assim, de um modo geral: mundos primitivos, onde se verificam as primeiras encarnações da alma humana; mundos de expiação e de provas, em que o mal predomina; mundos regeneradores, onde as almas que ainda têm o que expiar adquirem novas forças, repousando das fadigas da luta; mundos felizes, onde o bem supera o mal; mundos celestes ou divinos, morada dos Espíritos purificados, onde o bem reina sem mistura. A Terra pertence à categoria dos mundos de expiações e de provas, e é por isso que nela estão expostas tantas misérias.

Os Espíritos encarnados num mundo não estão ligados a ele indefinidamente, e não passam nesse mundo por todas as fases do progresso que devem realizar, para chegar à perfeição. Quando atingem o grau de adiantamento necessário, passam para outro mundo mais adiantado, e assim sucessivamente, até chegarem ao estado de Espíritos puros. Os mundos são as estações em que eles encontram os elementos de progresso proporcionais ao seu adiantamento. É para eles uma recompensa passarem a um mundo de ordem mais elevada, como é um castigo prolongarem sua permanência num mundo infeliz, ou serem relegados a um mundo ainda mais infeliz, por se haverem obstinado no mal.

Minhas Reflexões


Nós espíritas acreditamos que a Terra é um plano de expiação e provas, mas parece que nos esquecemos disso quando nos invadem as sensações de prazer que podemos vivenciar vestindo essa roupa a que chamamos corpo. Assim como, quando lamentamos ter que passar por desventuras, sentir as dores, as tristezas.

Seja na alegria, seja na dor temos a tendência de num primeiro momento considerar apenas essa experiência encarnatória e esquecemos-nos dos tantos mundos que já habitamos e poderemos habitar em nossa jornada evolutiva.

Se nascemos pobres, remediados ou ricos. Se durante a existência isso tudo se transforma, melhorando ou decaindo, isso pertence a um todo maior e não somente a essa experiência terrena. Os sabores e dissabores são oportunidades de desenvolvimento, de melhoria. São lições que podemos com a força de nosso Eu transformar em aprendizados. E nosso livre-arbítrio, que nos permite as escolhas, deve considerar mais do que aquele momento, seja ele doloroso ou prazeroso.

Se na Terra, somos revestidos de matéria e com a matéria interagimos é justo que nos preocupemos com os TER, mas é preciso se conectar com o SER, que veio a esse mundo, viver a experiência encarnatória como oportunidade de desenvolvimento. O TER é importante, mas nunca deve estar desvinculado do projeto evolutivo a que nos propomos, mesmo que seja difícil ter clareza de que projeto é esse, que missão é essa.

Então, se vivemos privações dificuldades, é comum lamentarmos, pois, como ainda temos muito a aprender, na hora do aperto perdemos a capacidade de enxergar com amplidão, olhamos a vida através de um tubo, reduzindo o campo de visão, focando apenas naquilo que escolhemos focar, mesmo que seja sem perceber. E o mesmo podemos dizer sobre os momentos de alegria extrema, quando enlevados queremos manter aquela sensação para sempre.

Seja na dor ou na alegria esquecemos que tudo é transitório, impermanente. E que as aflições e júbilos da vida na terra, são típicos desse plano e que para, se quisermos, viver em planos superiores temos que humildemente aprender essas lições.

Vejo muitos reclamando que tem pouco e consideram injusta essa condição, pois são pessoas de bem, que nada de mal fazem a outros. Mas, não seria essa vivência uma oportunidade para aprender algo sobre abundância? Não seria essa uma chance de refletir profundamente sobre os porquês que se vive a circunstância atual? Não seria, também, o ensejo para encontrar dentro de si a força e a forma para mudar o que é indesejado. Deus não deseja nosso sofrimento, quer apenas nossa evolução. E sinto, que a escolha do caminho é nossa, se será com sofrimento será fruto de nossa decisão. Assim como dizia o poeta, a dor é inevitável, o sofrimento é opcional.

E neste ponto quero falar um pouco da minha percepção sobre resignação. Acredito que aceitar passivamente situações que ferem nossa alma, seja por falta de recursos, seja por questões emocionais, é negar a nossa capacidade de transformação. Resignar-se é aceitar a condição atual, seja qual for, mas encontrar força e amor dentro de si para transformar positivamente a existência, considerando as próprias necessidades e a de todos que nos cercam.

Se não pensarmos nas melhorias da vida material, enquanto encarnados, negamos a importância do próprio corpo físico. Ele é nosso veículo para atuação nesse mundo físico e pq não poderíamos almejar cuidados e prazeres típicos dessa fase evolutiva. Desde, é claro, que a dimensão espiritual e o respeito pelos outros seres (de todos os reinos: mineral, vegetal, animal e humano) sejam cuidados na mesma medida.

O mesmo pode-se dizer daqueles que não conheceram a escassez. O fato de não vivenciá-la, não justifica ignorá-la.

O que quero dizer é que, na minha humilde visão, se não cuidarmos do nosso íntimo e nos esforçarmos para ter uma visão ampliada da vida terrena e de todos os outros mundos citados no Evangelho, ficaremos refém de nós mesmos, apegados às crenças que justificam nossas ações e nos impedem de conhecer outras visões, outras possibilidades.

Gostaria de contar uma história que ouvi recentemente vejo relacionada a essas reflexões:

O filho de uma querida amiga relatou uma experiência que teve na escola. O professor propôs aos alunos um tema e a idéia era apenas debater sobre o assunto, apenas apresentando os pontos de vista sem a defesa apaixonada que habitualmente se tem das próprias convicções. E a pergunta era a seguinte: Os ricos são responsáveis pelos pobres? Depois de algum tempo de conversa percebe-se a polarização: a maior parte da turma acreditava que não, que não tinham “culpa” de terem nascido em famílias abastadas. Do outro lado dizia-se que se tenho mais do que o suficiente, porque não ajudar a quem tem menos. E embora a proposta não fosse defender as convicções pessoais e apenas compartilhá-las, o debate acalorou-se, com cada grupo mantendo seus argumentos como verdade.

Penso que a nós que pouco importa o final desse debate. O que nós é importante é a reflexão sobre esse tema ampliando o ponto de vista que considera apenas essa existência.

E que possamos nos lembrar do simbolismo da passagem bíblica que fala da cura do cego:



Quando Jesus passava, viu um homem que era cego desde o seu nascimento; _ e seus discípulos lhes fizeram esta pergunta: Mestre, a causa de ter este homem nascido cego, é o pecado dele, ou de seus pais?

Jesus lhes respondeu: Não é que ele haja pecado, nem aqueles que o trouxeram ao mundo; mas assim sucede para que as obras do poder de Deus brilhem nele.

Depois de ter dito isso, cuspiu no chão, e tendo feito lama com a saliva, untou com essa lama os olhos do cego, e lhe disse: Ide vos lavar na piscina de Siloé. Ele foi, lavou-se, e voltou com vista.

Seus vizinhos e os que haviam visto antes a pedir esmolas, diziam: Não é este que estava sentado, e que pedia esmolas? Uns respondiam: Sim, é ele; outros diziam: Não, é alguém que com ele se parece. Porém ele lhes dizia: Sou eu mesmo. _ E então lhe perguntavam: Como é que vossos olhos estão abertos? _ Ele lhes respondia: Este homem a quem chamais Jesus fez lama e untou meus olhos, e me disse: Ide à piscina de Siloé, e banhai-vos aí. Eu fui, lavei-me, e vejo.



Então, pergunto-me: O que precisamos fazer para amorosamente tirar a lama de nossos olhos e passar a enxergar além do concreto, do facilmente explicável, do que nos parece obvio, do que é relativo apenas a essa experiência terrena.

E ainda, se Jesus disse: vocês podem fazer muito mais que EU, o que podemos fazer para apoiar nossos irmãos a encontrar sua própria Piscina de Siloé?

E passando a enxergar, o que faremos?

Talentos


Parábola dos Talentos

O Senhor age como um homem que, tendo de fazer longa viagem fora do seu país, chamou seus servidores e lhes entregou seus bens. - Depois de dar cinco talentos a um, dois a outro e um a outro, a cada um segundo a sua capacidade, partiu imediatamente. - Então, o que recebeu cinco talentos foi-se, negociou com aquele dinheiro e ganhou cinco outros. - O que recebera dois ganhou, do mesmo modo, outros tantos. Mas o que recebera um cavou um buraco na terra e aí escondeu o dinheiro de seu amo.

Passado longo tempo, o amo daqueles servidores voltou e os chamou às contas. - Veio o que recebera cinco talentos e lhe apresentou outros cinco, dizendo: Senhor, entregaste-me cinco talentos; aqui estão, além desses, mais cinco que ganhei. 

Respondeu- lhe o amo: Servidor bom e fiel; pois que foste fiel em pouca coisa, confiar-te-ei muitas outras; compartilha da alegria do teu senhor. 

O que recebera dois talentos apresentou-se a seu turno e lhe disse: Senhor, entregaste-me dois talentos; aqui estão, além desses, dois outros que ganhei. 

O amo lhe respondeu: Bom e fiel servidor; pois que foste fiel em pouca coisa, confiar-te-ei muitas outras; compartilha da alegria do teu senhor. 

Veio em seguida o que recebeu apenas um talento e disse: Senhor, sei que és homem severo, que ceifas onde não semeaste e colhes de onde nada puseste; - por isso, como te temia, escondi o teu talento na terra; aqui o tens: restituo o que te pertence. 

O homem, porém, lhe respondeu: Servidor mau e preguiçoso; se sabias que ceifo onde não semeei e que colho onde nada pus, - devias pôr o meu dinheiro nas mãos dos banqueiros, a fim de que, regressando, eu retirasse com juros o que me pertence. Tirem-lhe, pois, o talento que está com ele e dêem-no ao que tem dez talentos; -porquanto, dar-se-á a todos os que já têm e esses ficarão cumulados de bens; quanto àquele que nada tem, tira-lhe mesmo o que pareça ter; e seja esse servidor inútil lançado nas trevas exteriores, onde haverá prantos e ranger de dentes. (S. MATEUS, cap. XXV, vv. 14 a 30.) 

Minhas Reflexões

Na primeira e superficial leitura dessa parábola, o amo pode parecer um homem cruel e punitivo, afinal ele valoriza quem aumentou sua fortuna e penaliza aquele que, considerando-se zeloso, a enterrou aguardando o retorno do seu senhor. Qual seria então a lição apresentada? O que Jesus em sua sabedoria quis nos dizer com essas palavras? 

Penso que podemos começar analisando o significado da palavra talento. Numa rápida busca no dicionário podemos encontrar as seguintes definições:

Antiga moeda grega
Aptidão invulgar (natural ou adquirida)
Engenho, habilidade, dom. 

Na parábola Jesus refere-se à moeda, mas podemos ampliar nossa compreensão ao pensar nos tantos dons com os quais somos abençoados em nossas existências. São dons que utilizamos para ganhar nosso pão, para cuidar das pessoas queridas, para construir nossas casas, consertar nossos bens. Aprendemos tantas coisas durante uma vida. Uns são bons com números, outros com línguas, alguns hábeis com atividades manuais. Há ainda aqueles que parecem saber ouvir e acalmar as almas aflitas. São tantos talentos que podemos reconhecer em nós e nas pessoas com as quais convivemos. Mas, usamos esses talentos todos ou estamos enterrando-os sem perceber?
Se Deus nos presenteia com talentos vários é porque espera que façamos uso em prol do nosso desenvolvimento e, também, o da humanidade. 

Eu ouço muitas pessoas dizendo sou bom, levo minha vida sem atrapalhar ninguém, não faço mal ao meu semelhante, cuido da minha família, trabalho, ganho a vida honestamente. Isso é louvável, mas seria o suficiente? 

Apenas cuidar da própria vida seria suficiente? Onde mais nossos talentos podem ser bem vindos? Quais são as capacidades e potencialidades que poderíamos lançar mão para fazer um pouco mais do que já fazemos? 

O que estamos fazendo com nossos talentos? O que sabemos e podemos fazer e deixamos de lado ou para depois por estarmos apenas cuidando de nossas vidas? 

O que a alma nos pede no transcorrer da vida e por estarmos ocupados com a nossa rotina, fazemos ouvidos moucos? Seria possível resumir nossos dias em acordar, cuidar das nossas atribuições sem refletir sobre o real significado do que fazemos, do que somos, de nossa missão? 

Sem pensar na semente de sonho que foi plantada em nossas almas? E nos talentos que desenvolvemos para transformar esses sonhos em realidade? 

É claro que, muitas vezes, circunstancias nos fazem tomar decisões que nos afastam das possibilidades de colocar nossos genuínos talentos no mundo. Mas não seriam provas para que saibamos o quanto somos fortes e capazes? Quais são os nossos sonhos abandonados? Quais escolhas deixamos para trás? O que por medo e insegurança deixamos de fazer? 

Sei que muitos sacrifícios nos são exigidos, muitas vezes trabalhamos somente motivados pelos salários, pois não é fácil dar conta da vida, pagar as contas, fazer reservas para o futuro, realizar os pequenos sonhos. 

Mas, às vezes, há um clamor interno para que mudemos de atividade, mas por receio e acomodação não arriscamos novos passos e com isso perdemos oportunidade de desenvolver talentos e colocá-los a serviço do mundo. 

Por estarmos numa grande caminhada de desenvolvimento, imagino que muitas dificuldades são colocadas em nosso caminho, não para nos atrapalhar a jornada, e sim para nos fortalecer e nos manter no caminho. E os talentos e sonhos são as ferramentas que devemos lançar mão para afastar essas pedras, permitindo que sigamos adiante. 

Mas, é fundamental que dediquemos tempo e esforço para compreender quais são nossos talentos. Aristóteles disse: “Onde cruzam meus talentos e paixões com as necessidades do mundo, lá está o meu lugar”. 

E quando encontramos esse lugar e nele usamos nossos talentos, parece que eles se multiplicam. Se os guardamos, acontece o inverso: atrofiam como se fosse um músculo privado de atividade. 

Mas, qual seria a relação dos nossos talentos com nossos sonhos? Inclusive aqueles abandonados ou aqueles não percebidos? 

Gostaria de substituir a metáfora da moeda para a da semente e perguntar: em que solo estamos plantando nossas sementes. 

Não seriam nossos sonhos reflexos dos contratos que fizemos antes de reencarnar nessas vidas. Não seriam os sonhos as sementes que temos que tirar da dormência e procurar terra fértil para que germinem? 

Penso que é urgente refletir sobre onde estamos jogando nossas sementes: num fértil solo ou sobre o cimento? 

E se pensarmos não somente em nós? E se ampliarmos nossa reflexão além das nossas existências e pensarmos na humanidade? Se nossa realização está diretamente ligada ao bom uso dos talentos não seria equivocado afirmar que ao nos realizarmos o mundo também é beneficiado? 

Eu acredito, que quando trabalhamos, seja para uma empresa, seja para um projeto, em casa, seja voluntaria ou remuneradamente, utilizamos nossos talentos, mesmo que tenhamos pouca consciência disso. Eles vão à pratica no dia a dia, quando executamos as tarefas a nos atribuídas e também, quando cuidamos para manter relações saudáveis com os outros, assim como o fazemos para compreender o que nos conecta verdadeiramente aquele trabalho. 

Mas, os talentos não se revelam somente no trabalho. Eles podem ser necessários em tantas outras situações da vida e para isso é preciso atenção, desapego e dedicação. Olhemos a nossa volta, o que podemos fazer com o coração entregue para contribuir para o desenvolvimento da humanidade?

Se sei escrever, esse é um talento.
Se sou bom ouvinte, esse é um talento.
Se sou perspicaz, esse é um talento.
Se sou organizada, esse é um talento.
Se sou questionadora, esse é um talento.
Se sei plantar, esse é um talento.
Se sei limpar a casa, esse é um talento.
Se sei informática, esse é um talento.
Se sei dirigir, esse é um talento.
Se sei contar histórias, esse é um talento.
Se sei cozinhar, esse é um talento.
Se sei costurar, esse é um talento.
Se sei fazer contas, esse é um talento.
Se sei ensinar, esse é um talento

Sim, há muitas formas de manifestar nossos talentos. A pergunta que fica é: como posso colocá-los a serviço do mundo? Como posso ganhar a vida e meu sustento com brilho nos olhos? Como posso doar um pouco do que já recebi? Como posso identificar o que já recebi? 

Como saber se não estou enterrando meus talentos? Como saber se não estou jogando minhas sementes de sonho no cimento? 

Não há resposta pronta, tampouco, definitiva. Mas, se cada um de nós, com coragem e amorosidade, olhar para a própria história, provavelmente encontrará fios que precisam ser reconectados, sonhos que desejam ser realizados e talentos adormecidos pedindo para serem acordados. Não importa se, com nossas habilidades, vamos ganhar nosso pão ou simplesmente doar ao mundo algo bom, o que vale é não enterrar nossos talentos e transformá-los em frondosas arvores que oferecem sombra e alimento para a humanidade. 

O Buraco da Agulha


Ninguém pode servir a dois senhores, porque ou odiará a um e amará a outro, ou se prenderá a um e desprezará o outro. Não podeis servir simultaneamente a Deus e a Mamon.

Uma das parábolas que aborda o tema conta que um jovem se aproximou de Jesus e disse: Bom mestre, que bem devo fazer para adquirir a vida eterna?

- Respondeu Jesus: Por que me chamas bom? Bom, só Deus o é. Se queres alcançar a vida eterna, guarda os mandamentos.

- Que mandamentos? retrucou o mancebo.

Disse Jesus: Não matarás; não cometerás adultério; não furtarás; não darás testemunho falso. - Honra a teu pai e a tua mãe e ama a teu próximo como a ti mesmo.

O moço lhe replicou: Tenho guardado todos esses mandamentos desde que cheguei à mocidade. Que é o que ainda me falta?

- Disse Jesus: Se queres ser perfeito, vai, vende tudo o que tens, dá-o aos pobres e terás um tesouro no céu. Depois, vem e segue-me.

Ouvindo essas palavras, o moço se foi todo tristonho, porque possuía grandes haveres.

- Jesus disse então a seus discípulos: Digo-vos em verdade que é bem difícil que um rico entre no reino dos céus. - Ainda uma vez vos digo: É mais fácil que um camelo passe pelo buraco de uma agulha, do que entrar um rico no reino dos céus. 



Minhas reflexões
Mamon é um termo, derivado da Bíblia, usado para descrever riqueza material ou cobiça, mas as sábias falas de Jesus, sempre tão cheias de metáforas, podem ser lidas de maneira mais abrangente. Penso que Jesus não se referia somente a bens materiais, fortunas, boa casa, bom carro, dinheiro no banco, patrimônio. Imagino que não falava somente do que é tangível, mensurável e ostentável.

Identificar o apego ao que é material é relativamente fácil. Usamos verbos e pronomes para indicar nossas posses: Isso é meu, eu tenho, eu fiz... Guardamos coisas sem questionar a necessidade, quando fazemos a limpa no guarda-roupa há uma ou outra peça que volta para o cabide. Às vezes, deixamos de emprestar, por exemplo, um livro que poderia servir ao outro por receio de não recebê-lo de volta. Mas, esses exemplos falam do que é palpável: um livro, uma roupa. Mas, e o apego às idéias, crenças, convicções?

Jesus, quando usou a imagem do buraco da agulha, possivelmente referia-se a um portão existente em Jerusalém que por ser tão pequeno e estreito, um camelo não poderia atravessá-lo sem que estivesse sem bagagem e reclinado.

Analisando essa metáfora, ouso dizer que a bagagem carregada por esse camelo é composta além de bens materiais, do conjunto de crenças não questionadas que carregamos vida afora.

O que há em nossa bagagem? Como temos nos conduzido pela vida? Quais são as antigas e enrijecidas crenças que necessitamos rever? O que em nossas mentes se fecha para o novo? A que idéias nos apegamos e assim nublamos nossos olhos para outras possibilidades? O que nos faz acreditar que estamos sempre certos? Sinto que é preciso nos livramos dessa riqueza ilusória das certezas vãs. Certezas, que como espíritas acreditamos, que podem nos acompanhar por várias existências.

Por apego, podemos nos limitar e, assim, não enxergar que é o novo. O que tem frescor só nasce se deixarmos morrer o velho. Falo da morte como transformação, como momento de transição, e para isso, penso que é necessário aprender a confiar no intangível, no imponderável para aprender o desapego.

Sim, penso, que o desprendimento pode ser aprendido. E essa lição a vida nos dá freqüentemente. Porém na maioria das vezes, reclamamos das experiências que frustram nossas expectativas e não reconhecemos as lições, logo não as transformamos em aprendizados para nos guiar no caminho que segue.

Penso, também, no camelo reclinado às portas do “Buraco da Agulha” e isso me remete à humildade. E para sermos humildes, para realizar uma mudança profunda e cruzar o “Buraco da Agulha”, precisamos desfazer-nos da nossa própria bagagem, de tudo o que não é essencial: necessidades de nossos egos e reputação, apegos a resultados específicos e expectativas sobre o que precisa acontecer. A mudança pede que desaprendamos coisas que acreditamos ser verdadeiras.

É preciso saber, para cruzar o Buraco da Agulha, que por estarmos encarnados, carecemos da matéria, mas é imperioso questionar quais são nossas reais necessidades, sejam materiais ou imateriais.

Rudolf Steiner, um grande estudioso que viveu entre o final do século 19 e início do século 20, escreveu algo muito apropriado sobre esse tema:

Eis, um lema os homens devem empunhar, caso contrário não haverá progresso em nossos tempos insanos:

· procurem a vida realmente prática e material, mas procurem-na de modo que ela não os torne insensíveis ao espírito que nela atua.

· procurem o espírito, mas não o procurem com volúpia metafisica, por egoísmo metafisico; procurem-no por quererem usa-lo desinteressadamente na vida prática, no mundo material.

· observem o velho princípio "espírito nunca sem matéria, matéria nunca sem espírito", de modo a poderem dizer": queremos realizar toda ação material à luz do espírito, e queremos procurar a luz do espírito de modo tal que ela nos desenvolva calor para nossa ação prática".

O Evangelho segundo o Espiritismo ainda nos traz a seguinte reflexão:

Se a riqueza houvesse de constituir obstáculo absoluto à salvação dos que a possuem, conforme se poderia inferir de certas palavras de Jesus, interpretadas segundo a letra e não segundo o espírito, Deus, que a concede, teria posto nas mãos de alguns um instrumento de perdição, sem apelação nenhuma, idéia que repugna à razão. Sem dúvida, pelos arrastamentos a que dá causa, pelas tentações que gera e pela fascinação que exerce, a riqueza constitui uma prova muito arriscada, mais perigosa do que a miséria. É o supremo excitante do orgulho, do egoísmo e da vida sensual. E o laço mais forte que prende o homem à Terra e lhe desvia do céu os pensamentos. Produz tal vertigem que, muitas vezes, aquele que passa da miséria à riqueza esquece de pronto a sua primeira condição, os que com ele a partilharam, os que o ajudaram, e faz-se insensível, egoísta e vão. Mas, do fato de a riqueza tornar difícil a jornada, não se segue que a torne impossível e não possa vir a ser um meio de salvação para o que dela sabe servir-se, como certos venenos podem restituir a saúde, se empregados a propósito e com discernimento.

Quando Jesus disse ao moço que o inquiria sobre os meios de ganhar a vida eterna: "Desfase-te de todos os teus bens e segue-me", não pretendeu, decerto, estabelecer como princípio absoluto que cada um deva despojar-se do que possui e que a salvação só a esse preço se obtém; mas, apenas mostrar que o apego aos bens terrenos é um obstáculo à salvação. Aquele moço, com efeito, se julgava quite porque observara certos mandamentos e, no entanto, recusava-se à idéia de abandonar os bens de que era dono. Seu desejo de obter a vida eterna não ia até ao extremo de adquiri-la com sacrifício.

O que Jesus lhe propunha era uma prova decisiva, destinada a pôr a nu o fundo do seu pensamento. Ele podia, sem dúvida, ser um homem perfeitamente honesto na opinião do mundo, não causar dano a ninguém, não maldizer do próximo, não ser vão, nem orgulhoso, honrar a seu pai e a sua mãe. Mas, não tinha a verdadeira caridade; sua virtude não chegava até à abnegação. Isso o que Jesus quis demonstrar. Fazia uma aplicação do princípio: "Fora da caridade não há salvação".

A conseqüência dessas palavras, em sua acepção rigorosa, seria a abolição da riqueza por prejudicial à felicidade futura e como causa de uma imensidade de males na Terra; seria, ao demais, a condenação do trabalho que a pode granjear; conseqüência absurda, que reconduziria o homem à vida selvagem e que, por isso mesmo, estaria em contradição com a lei do progresso, que é lei de Deus.

Se a riqueza é causa de muitos males, se exacerba tanto as más paixões, se provoca mesmo tantos crimes, não é a ela que devemos inculpar, mas ao homem, que dela abusa, como de todos os dons de Deus. Pelo abuso, ele torna pernicioso o que lhe poderia ser de maior utilidade. E a conseqüência do estado de inferioridade do mundo terrestre. Se a riqueza somente males houvesse de produzir, Deus não a teria posto na Terra. Compete ao homem fazê-la produzir o bem.

Com efeito, o homem tem por missão trabalhar pela melhoria material do planeta. Mas, acredito que essa melhoria só será possível se nos abrirmos para o novo que nos chama e nossos ouvidos teimosos insistem em apenas ouvir o já conhecido. É urgente pensar em como integrar e para isso é necessário avaliar do cada um de nós pode abrir mão em função do todo.

Penso que se faz urgente aliar esse pensamento ligado à melhoria material no planeta ao desapego de idéias já vencidas. É preciso superar nossos medos, desprender-se das identidades antigas, aquelas em que construímos a imagem do que somos. Mas somos ao mesmo tempo muito mais e muito menos que essa imagem.

Precisamos desapegar do que pensamos que somos para viver plenamente o que somos, seres em evolução, numa longa e árdua jornada de desenvolvimento.

Então, acredito que um rico pode entrar no reino dos céus, mas é de outra riqueza que falo. Falo da abundancia de bondade, humildade e desapego.

E, eu, francamente, me percebo no inicio dessa caminhada. Ainda há muito chão a ser trilhado, muitas pedras pelo caminho e muitas lições, que rogo, possa vir a aprender.


A primeira pedra




Não julgueis, pois, para não serdes julgados; porque com o juízo que julgardes os outros, sereis julgados; e com a medida com que medirdes, vos medirão também a vós. (Mateus, VII: 1-2). 

Então lhe trouxeram os escribas e os fariseus uma mulher que fora apanhada em adultério, e a puseram no meio, e lhe disseram: Mestre, esta mulher foi agora mesmo apanhada em adultério; e Moisés, na Lei, mandou apedrejar a estas tais. Qual é a vossa opinião sobre isto? Diziam pois os judeus, tentando-o, para o poderem acusar. Jesus, porém, abaixando-se, pôs-se a escrever com o dedo na terra. E como eles perseveraram em fazer-lhes perguntas, ergueu-se Jesus e disse-lhes: Aquele dentre vós que estiver sem pecado atire-lhe a primeira pedra. E tornando a abaixar-se, escrevia na terra. Mas eles, ouvindo-o, foram saindo um a um, sendo os mais velhos os primeiros. E ficou só Jesus com a mulher, que estava no meio, em pé. Então, erguendo-se, Jesus lhe disse: Mulher, onde estão os que te acusavam? Ninguém te condenou? Respondeu ela: Ninguém, Senhor. Então Jesus lhe disse: Nem eu tampouco te condenarei; vai, e não peques mais. (João, VIII: 3-11). 





Minhas Reflexões

O julgamento é algo inerente ao ser humano. Se aqui estamos encarnados é porque ainda há muito em nós a ser desenvolvido. E a cada reencarnação nós é dada a oportunidade de aprender a lidar com as imperfeições humanas e desenvolver a capacidade compreensão de si próprio e dos outros.
 
Mas, esse é um caminho que exige do caminhante determinação, coragem e humildade, pois durante a existência terrena somos continuamente postos a prova. Em nossa sociedade atual em que estamos expostos e, também, nos expomos voluntariamente através das redes sociais e veículos de comunicação julgamos e somos alvo de julgamentos o tempo todo. 

As diversas formas de pensar, de se vestir, de agir, de se manifestar são alvos de julgamentos. Sem perceber rotulamos as pessoas e criamos categorias, como se fosse possível resumir um ser humano de forma a reduzi-lo a um rotulo. Costumamos dizer, por exemplo, que os motoboys são irresponsáveis. Sim é fácil observar nas ruas da cidade atos inconseqüentes de alguns, mas não paramos para pensar naquele ser em sua totalidade: quais serão suas necessidades?, o que o fez escolher essa profissão tão cheia de riscos?, pq pilotam suas motocicletas com aparente imprudência? Não, não fazemos essas perguntas, não nos interessamos por aquele ser. O que fazemos é imediatamente julgar e declará-lo irresponsável. 

E o pior, acreditamos nos rótulos e nos referimos e nos comportamos diante das pessoas a partir do julgamento que delas fizemos. 

Recentemente, recebi por email fotos que mostravam a coleta de ovos de tartarugas às margens do rio Solimões, à beira de um assentamento do MST. 
O texto carregado de julgamentos, execrava os assentados, julgando-os por roubar os ovos para vender. O meu impulso foi de repassar a mensagem a meus contatos, para servir de alerta e quem sabe acabar com essa pratica. Mas, felizmente algo me fez parar e refletir sobre aquelas fotos e textos. 

As imagens são impactantes, é verdade, porém é preciso olhar além delas para compreender o que faz essas pessoas “colherem” os ovos de tartaruga. Por conta do meu trabalho, tenho contato com alguns assentados e saber um pouco da história deles me permite compreender, embora não aprove, atitudes como essa. 

Os acampados ou assentados são em sua maioria pessoas simples que lutam para ter algo nas panelas para alimentar a família. Consigo, sem muito esforço, entender o que os fazem encher sacos e sacos com os ovos. 

Quero deixar claro que não estou defendendo ninguém, apenas sinto que temos o dever moral de olhar para os vários lados da questão e essas fotos e textos mostram apenas um lado. 

Talvez eu consiga ter essa visão mais ampliada sobre a questão porque a vida me permitiu conhecer um pouco dessa gente que luta bravamente para dar conta das suas necessidades básicas e que, infelizmente, tem pouco acesso às informações e conceitos que poderiam ampliar suas consciências. Mas, pergunto-me se eu não julgaria da mesma forma se não os conhecesse um pouco? 

Penso que aí está nosso grande desafio, cuidar dos nossos julgamentos mesmo que nos falte conhecimento. Sinto que é nossa obrigação buscar as informações necessárias para saber o que faz alguém agir dessa ou daquela forma. É preciso humildade para aceitar que pouco sabemos sobre nós mesmos, quanto mais sobre os outros. 

Não consigo enxergar outra forma de não nos deixarmos levar pelos julgamentos senão pelo desenvolvimento da empatia, a capacidade humana de se colocar no lugar do outro. E isso só é possível, em minha opinião, se nos dedicarmos a conhecer nosso próprio lugar, se tivermos consciência de nossos próprios erros e limitações. É preciso aprender a ser humilde e desenvolver a capacidade de perdoar, genuinamente perdoar. Aos outros e a si próprio.